quarta-feira, 22 de abril de 2009

A arte do arranjo

(na sequência do post anterior, com “Letter From Home”, de Pat Metheny/Lyle Mays, pela Bob Curnow's L.A. Big Band)

(músicas, a anterior e a que segue, para ouvir generosamente alto)

Decorreu já um considerável espaço de tempo desde as últimas vezes em que ouvi os álbuns dos vários grupos de Pat Metheny, lançados entre meados dos anos 80 e o início dos anos 90. Com sucessivas formações diferentes, cada álbum desta fase proporcionou, a mim e a uma legião de seguidores, horas sem conta do mais puro deleite (isto, não contando com os primeiros discos editados com as formações iniciais).

Ouvi-los – e tocar sobre eles – repetidamente, do princípio ao fim, fez-me conhecer-lhes a maior parte dos detalhes e a sua gigantesca complexidade harmónica, melódica e rítmica.

Ao aperceber-me da existência de uma big band - Bob Curnow's L.A. Big Band - com um CD chamado “The Music of Pat Metheny & Lyle Mays“, agitei-me de curiosidade e cepticismo. Um pouco como o próprio Pat Metheny:

"I have to admit I was really touched by the whole thing when I heard it. I didn't quite know what to expect, and I was a bit apprehensive, but when I heard it -- yeah !! I felt Curnow's band got the vibe right." - Pat Metheny

Uma coisa é o carácter orquestral – e sinfónico até, como no caso do álbum “Secret Story” - de grande parte das composições de Metheny/Mays. Outra é arranjá-las para uma big band com 20 elementos, mantendo o bom gosto e respeitando a complexidade dos originais.

Foi o que fez um veterano da orquestra de Stan Kenton, Bob Curnow, arranjador e reputadíssimo educador na área do jazz. Curnow dirige várias formações de jazz bem como orquestras sinfónicas, e estabeleceu a sua própria loja e catálogo de arranjos e música escrita. Os resultados de uma tarefa como aquela a que se propôs percebem-se em faixas como esta.



The First Circle”, de 1984, é um exemplo do talento de Bob Curnow como arranjador:

"This particular arrangement, acclaimed as one of the best big band arrangements ever done, is rhythmically complex with alternating 12/8 and 10/8 bars in 3-2-3-2-2 and 3-3-2-2 patterns. There are constantly shifting meters and sounds from the various sections, creating an intellectually stimulating tone poem of continually increasing waves, with a driving modern beat beneath all."

Notável a forma como Curnow substitui os timbres do original por texturas da orquestra que tem à sua disposição. Ver como ele resolveu a complexa parte de guitarra do original que decorre entre os 1’10’’ e 2’25’’, foi a minha primeira grande curiosidade. Depois aparece o crescendo orquestral a culminar no solo que, no original, é do piano, e aqui é muitíssimo bem desempenhado por um sax soprano.

Tudo isto, nesta faixa e nas restantes do disco, decorado a contraponto com as texturas das várias secções da Bob Curnow's L.A. Big Band.

Faixas no disco, agrupadas por ordem cronológica dos CD’s de origem:

The First Circle (1984)
03. The First Circle
06. If I Could

Still Life (Talking) (1987)
08. Minuano (Six Eight)
01. (It's Just) Talk
11. In Her Family

Letter from Home (1989)
12. Have you Heard
10. Every Summer Night
09. Dream of the Return
05. Are We There Yet
04. Letter from Home

Secret Story (1992)
02. Always and Forever
07. See the World

12 comentários:

Anonyma disse...

Gostei.
Mesmo, mesmo.
:)

sem-se-ver disse...

1. ideia mt gira, esta.

2. interessantes arranjos, estes.

3. belíssimo post, este.


e não me admira nada nadinha que tenhas gostado tanto :))

fj disse...

anonyma, este álbum é daqueles que eu ainda não consegui parar de ouvir desde que o ouvi pela primeira vez. diria que, para quem gosta da obra do pat metheny, é obrigatório ouvir - já não digo gostar - deste cd. :-)

fj disse...

ssv,

1. são ideias porreiras, não são? faz-me lembrar, pela originalidade e pela ambição do projecto, o dark side of the moon a capella.

2. gosto muito dos arranjos, indeed!

3. o post podia ter sido melhorzito. ficou muito sério e chato. obrigado :-))

sem-se-ver disse...

qual... ficou excelente.

sim, lembro bem esse teu post e a revelação que ele constituiu para mim..


é tão bom qd não há 'vacas sagradas', não é?...

Rui disse...

O que sempre acho extraordinário em arranjos - que coisa deslumbrante de dificuldade esta - é a oportunidade natural que me proporcionam para reescutar o que já conheço de trás para a frente. Mas confesso que detesto quando essa adesivagem se tenta fazer sem criar um produto artístico novo. Aqui o solo de sax e a utilização do flugel em vez do Pedro Aznar (
é o argentino no original, não é?) conferem essa inovação que não nos faz esquecer o deslumbramento original mas que nos fazem sucumbir a uma nova experiência, a um novo deslumbramento. que bom que isto é tudo. Esta força, raizapartam...

fj disse...

sabes, rui? cada vez que decido ouvir isto dentro do carro a coisa começa muito bem e tento escutar com atenção todos os pormenores. a partir de determinada altura, e então depois do solo, caramba, descambo completamente e acabo a guinchar de forma ridícula a melopeia do original - do pedro aznar, sim! caricato, deve ser absolutamente caricato, visto de fora do carro!

não há neste álbum nada que se sobreponha aos originais ou os substitua. no entanto, é perfeitamente arrebatador e, uma vez começado a ouvir, é impossível parar.

Rui disse...

Tu conheces a minha malapata em relação à música de intervenção vintssincodabriliopovistácuémiéfiá. Quando ouço isto acho que é assim que se deve festejar a liberdade. Desta forma; intensa, íntima, graciosa, descomunal, poderosa.

Rui disse...

magnânime

fj disse...

e arrebatadora.

GRAINOFSAND disse...

Amigo fêjê, como sabes sou o tal "marin d´eau douce" nestas andanças mas os meus ouvidos/coração/alma de amante de música têm já aqui longa estrada se pudermos medir pela intensidade com que amo de paixão este mago da sweat às riscas...
Gostei bastante desta versão e vou querer ouvir o disco na totalidade, porém, fico com vontade de ir ouvir o original para entrar em levitação naquele "tal" momento com a voz viciante do Aznar...

p.s Espero que voltemos a vê-lo por cá em breve, e no fim do espectáculo vamos ter com ele mas mais "tu cá tu lá" desta vez, e dizes: hey Pat ´ma man! e eu pergunto-lhe:" Are You Going With Me? ;)

fj disse...

grainofsand,
bem sabes que alinhava nessa, claro.
aqui está o first circle, versão ao vivo, sempre arrebatadora!